Gary Bettman comenta sobre desafios do último ano na NHL

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Há exatamente um ano, o comissário da NHL, Gary Bettman, anunciou que a liga entraria em pausa por tempo indeterminado em razão do crescente número de casos de COVID-19 na América do Norte. A decisão veio no dia 12 de março de 2020, data que viu também diversas ligas e associações esportivas em todo o planeta cancelar desde jogos decisivos a reuniões e eventos de pré-temporada.

Este movimento se desencadeou na noite anterior, uma quarta-feira, quando Rudy Gobert (Utah Jazz, NBA) testou positivo para o novo coronavírus. Quase que de imediato, a NBA suspendeu indefinidamente o resto de sua temporada regular. A partida preste a acontecer na liga foi interrompida e milhares de torcedores foram evacuados da arena.

“Eles instantaneamente entraram em modo de paralisação,” comentou Bettman, em uma coletiva de imprensa na tarde de ontem (11). “Nós não queríamos passar por aquela situação. Não queríamos um prédio cheio de pessoas. Nós queríamos ser um pouco proativos.” Era claro para Bettman que a liga logo também teria que lidar com casos positivos de COVID.

Naquela mesma noite de 11 de março de 2020, a NHL concluiu suas últimas cinco partidas com as arenas lotadas. Com o avanço do novo vírus nas semanas que antecederam a pausa, a liga já se estruturava para tomar as medidas necessárias para a segurança de seus jogadores, funcionários e fãs. Vimos a limitação do acesso da mídia aos vestiários, e estávamos nos acostumando à ideia de jogos sem torcida em algumas cidades. (Eu mesma ainda tinha planos de ir a um jogo da NBB aqui em São Paulo naquele final de semana – a liga brasileira anunciou no dia seguinte que os próximos jogos aconteceriam com portões fechados).

Bettman e o comissário adjunto da NHL, Bill Daly, convocaram uma reunião naquela quinta-feira (12) com o Conselho Executivo da liga, e não muitas horas depois foi anunciada a pausa. Desde então, acompanhamos um ano inteiro de decisões e mudanças na NHL, lidando com cada desafio conforme eles aparecem. Ninguém sabia como a situação iria se desenvolver a partir daquele fatídico 12 de março. Até hoje, um ano depois, ainda há incógnitas, não só nos esportes, mas em todos os aspectos de nossas vidas em meio à pandemia.

“Nosso objetivo e nosso trabalho era conduzir (a situação) da melhor forma possível, entendendo que saúde e segurança precisavam ser a preocupação nº1. Foi nosso foco 365 dias atrás. É nosso foco e prioridade nº1 hoje.” comentou Bettman.

Eventualmente, a NHL teve sucesso em concluir os playoffs da temporada 2019-20 em suas “cidades-bolha” – e sem registrar casos positivos de COVID-19 nelas –, coroar um novo vencedor da Stanley Cup, realizar um draft virtual, criar diferentes iniciativas e comitês de diversidade e inclusão, negociar uma extensão para o CBA com a NHLPA, dar início a uma nova temporada, realizar jogos ao ar livre, trazer novas parcerias corporativas para a liga e revelar um novo acordo televisivo com a ESPN americana.

“Mesmo hoje, é quase difícil de acreditar que estamos fazendo isso há um ano. E ainda não acabamos,” Bettman comentou. Ao examinar todos os meses que se passaram desde a pausa na temporada anterior, o comissário exaltou a cooperação com médicos e especialistas. Da mesma forma, mencionou a colaboração com o governo dos estados/províncias e cidades que abrigam cada uma das franquias.

No início desta temporada reduzida, até o seu segundo mês, a NHL lidou com algumas complicações face ao avanço do vírus. Porém, com novos protocolos e medidas em vigor, parece caminhar para uma situação de maior controle e segurança para todos. Bill Daly ofereceu “bastante crédito” à NHLPA e aos jogadores ao aderir aos novos protocolos necessários. No dia 12 de fevereiro, a lista de jogadores no Protocolo de COVID da liga atingia um pico de 59 pessoas. Um mês depois, eram apenas quatro nomes listados, dentre todas as equipes.

Ainda com alguns desafio à frente, pouco a pouco, a liga acredita em um retorno a alguma normalidade. “Conforme olhamos adiante, mais da metade de nossos clubes têm fãs nas arenas, em um número limitado,” disse Bettman. “Ao vermos esse número aumentar, contanto que a pandemia coopere e tenhamos mais e mais vacinações, estamos otimistas de que ao irmos em direção aos playoffs, o número de clubes e o número de pessoas continue a crescer. Vamos continuar nos ajustando conforme o necessário para completar a temporada regular e conduzir os playoffs. E nós seguimos otimistas de que possamos estar bem próximos, se não totalmente de volta ao normal para o começo da próxima temporada.”

Gary Bettman e Bill Daly durante a coletiva de imprensa desta quinta-feira (captura de tela/NHL.com)

Mudanças que não vieram para ficar

A atual temporada 2020-21 começou na metade de janeiro, e teve seu calendário regular reduzido de 82 para 56 jogos. Além do menor número de jogos, a NHL também precisou realinhar suas divisões em razão das restrições de viagem entre Estados Unidos e Canadá.

Vimos os 31 times se dividirem em quatro novos grupos: Leste, Central, Norte e Oeste. As equipes jogam apenas em sua própria divisão até o segundo round dos playoffs, e isso serviu para reviver algumas antigas rivalidades e também oferecer um produto inédito com os confrontos só entre times canadenses.

Apesar dos diversos apelos deste formato quase 100% divisional, Bettman esclareceu na coletiva que o realinhamento não deve se estender além dessa temporada. “Nós fizemos o que precisava ser feito se quiséssemos jogar este ano,” disse o comissário da liga. “Nós entendemos o problema da fronteira entre Canadá e Estados Unidos e criamos a Divisão Norte. Poderemos focar mais em confrontos divisionais no futuro, porém eu não tenho certeza se isto se manteria em uma agenda de 82 jogos.

“Funcionou bem este ano. Eu não vejo isso se propagar. Fãs nos EUA querem ver Connor McDavid, fãs no Canadá gostariam de ver Sidney Crosby,” ele concluiu. Dessa forma, a única mudança que veremos a partir da próxima temporada será a já confirmada ida do Arizona Coyotes para a Divisão Central, deixando uma vaga para a chegada do Seattle Kraken na Divisão Pacífica. 

Voltando a cruzar fronteiras

Na coletiva, tanto Bettman quanto Daly não se precipitaram ao falar dos planos para esta pós-temporada. Após as finais de divisão, na segunda rodada dos playoffs, será necessário que o vencedor do Norte enfrente uma das equipes americanas, e ainda não há decisão sobre a melhor forma de realizar estas partidas. 

Dadas as atuais restrições de viagem e de público em eventos no Canadá, tudo ainda é muito incerto. Por isso, espera-se que até chegar a hora de disputar o terceiro round, haja menos limitações para que os jogos aconteçam. Daly afirmou estar em contato com oficiais do governo canadense para discutir as possibilidades. “A primeira vez que o time canadense teria que viajar para fora do Canadá ou vice-versa, um time dos EUA entrando no Canadá, seria em meados de junho, então temos algum tempo para lidar com isso,” ele disse.

Após a realização dos jogos do NHL Outdoors em Lake Tahoe no mês passado, a liga também voltou a atenção para a possibilidade de retomar seus eventos especiais na próxima temporada. Entre eles, os jogos na Europa, que não foram possíveis no ano anterior por conta das restrições da COVID-19, tanto na América do Norte quanto no velho continente. Daly disse que “se não pudermos, por qualquer motivo, relançar esses jogos no próximo outono, certamente espero que possamos fazê-lo na temporada seguinte.”

A NHL e NHLPA também vêm discutindo sobre as condições do retorno aos Jogos Olímpicos de Inverno. A próxima edição do evento está marcada para fevereiro de 2022, em Pequim, na China. “O COI agora está ocupado em termos de finalizar os planos para o que será (Tokyo 2020) e, ainda que eles tenham notado essa questão – o hockey e a potencial participação da NHL e seus jogadores – em seu radar e que eles precisam lidar com isso, ainda não estão em posição de fazê-lo concretamente,” afirmou Daly. Uma vez finalizada a preparação para as Olimpíadas deste ano, o Comitê deve se engajar novamente com a IIHF para retomar as conversas sobre a participação dos NHLers

Os principais pontos a se acordar entre liga, PA, COI e Federação envolvem algum tipo de seguro e o custo disso para os participantes, além dos custos de viagem e acomodação dos jogadores, suas famílias. Espera-se também que NHL e NHLPA briguem pela obtenção de algum direito de uso de imagem e vídeo dos eventos olímpicos.

As próximas grandes estrelas

Bettman e Daly não se prolongaram a falar do NHL Draft deste ano ou das possíveis mudanças no formato da loteria.

O comissário causou certa polêmica ao afirmar que “não acredita haver tanking na NHL.” Este termo se refere a um mecanismo pelo qual um time realiza uma temporada ruim a fim de terminar entre os últimos colocados e garantir uma escolha alta no draft.

As mudanças propostas à loteria, e que devem ser votadas pelo Conselho Executivo da NHL em breve, poderiam limitar a até duas as vezes em que um mesmo time receberia uma das primeiras escolhas num período de cinco anos. Além disso, um participante da loteria do draft não poderia subir mais que dez posições na ordem das escolhas. Por fim, no lugar das três primeiras picks, apenas as escolhas 1 e 2 seriam sorteadas entre os times participantes.

Quanto à data do 2021 NHL Draft, o comissário adjunto Bill Daly afirmou que ainda não há decisão se o evento precisará ser adiado. No entanto, ele acredita que provavelmente continuará marcado para os dias 23 e 24 de julho deste ano.

O principal argumento para um possível adiamento é o de que muitos jogadores que participariam do draft não puderam competir regularmente este ano. Da mesma forma, não podendo viajar e comparecer a muitos jogos, os scouts não tiveram o mesmo acesso via vídeo para fazer suas avaliações finais. Contudo, mais e mais observamos as principais ligas de hockey funcionando em meio à pandemia, tanto na América do Norte quanto na Europa. Muitos jogadores puderam encontrar times em atividade para jogar e continuar seu desenvolvimento. Daly afirmou que “é certamente uma situação imperfeita, mas nós vimos lidando com situações imperfeitas.”

Assim como muitos se mantêm otimistas quanto à volta à normalidade (dependendo do país em que você vive), autoridades da NHL acreditam que não só os eventos planejados num futuro próximo devam ocorrer sem maiores complicações, mas também a próxima temporada já deve se parecer muito mais com o que estávamos acostumados. Ainda, os preparativos para times como o New York Islanders e o Seattle Kraken também estão em dia para abrir a próxima temporada em suas novas arenas.

O plano, segundo Bettman, é retomar o calendário de 82 jogos a partir de outubro deste ano, para abrir a temporada 2021-22. “Estamos esperançosos, estamos planejando, estamos otimistas, e acreditamos sermos capazes de começar a próxima temporada em dia.

“Há uma luz no fim do túnel, mas essa não é a hora de baixar nossa guarda ou reduzir nossa vigilância.”

Foto: Reprodução/milehighhockey.com