A Colored Hockey League (CHL) foi uma liga amadora criada, em 1900, por descendentes de escravos em Halifax, Nova Scotia, no Canadá. Anterior até mesmo à National Hockey Assiciation (NHA), predecessora da NHL fundada em 1917. Entretanto, com menos adesão, a CHL foi extinta em 1925.
Em meados de 1880, os negros criaram, nas Ilhas Marítimas (CA), uma liga semiprofissional de Baseball, uma vez que não era permitido que eles competissem ao lado dos brancos. Sendo assim, o baseball era o esporte do verão. Logo, o hockey se tornaria o esporte do inverno.
Habilidade atléticas que já eram valorizadas naquela época no baseball, e que se tornariam ainda mais importantes 40 anos depois, também estavam presentes nessa liga de hóquei. O racismo e o preconceito relegaram esses atletas negros, pioneiros do hockey no Canadá, a um esquecimento, mas eles deixaram uma herança: um jogo rápido e forte, em que movimentos acrobáticos tornam tudo muito excitante e divertido.
Origens
Nova Scotia, com seus incontáveis lagos ideais para a patinação, é para muitos o berço do Hockey no Gelo. Um dos primeiros registros de uma partida de hockey é datado de 1802 em uma área conhecida como Long Pond, onde um grupo de nativos canadenses, denominados Mi’kmaqs, jogava com canadenses-europeus.
Entretanto, eles não eram os únicos a praticar o esporte. Só é possível datar a entrada dos canadense negros no hockey no começo de 1870. Existem, no entanto, evidências de que os negros já praticavam o esporte 100 anos mais cedo. Uma dessas provas é a de que aquela parte de Nova Scotia não era habitada por brancos, mas sim por negros.
O primeiro registro de um jogo de times compostos somente de negros remonta a 1895. Em 1900, a Colored Hockey League of the Maritimes (Liga das pessoas de cor de Hockey dos Marítimos, em tradução livre) foi criada em Halifax, na Nova Scotia, com apoio da igreja batista local.
A intenção era a de que o hockey se transformasse num catalisador de demandas ligadas à religião, à mobilidade social, à politica e à emergência de um Nacionalismo Negro. O caminho para a igualdade dos canadenses negros seria através do jogo. Dessa forma, o propósito era de elevar os negros a um nível que os tornariam iguais aos irmãos brancos, incentivando um importante senso de liderança, organização, propósito, determinação, trabalho em equipe e dever nos corações e mentes dos jovens negros.
A Colored Hockey League, era James Williams
Henry Williams, um jovem de 24 anos, foi fundamental para a criação de ligas negras de Halifax. Formado em direito, e nascido em Trinidad e Tobago, Williams ajudou a promover duas equipes de hockey: o Halifax Eurekas e o Halifax Stanley. Além disso, outra equipe composta só por negros existiu nessa época, o Dartmouth Jubilees.
A CHL surtiu 25 anos antes das Negro Baseball Leagues (Ligas Negras de Beisebol, tradução livre) e 22 anos antes do nascimento da NHL. Os negros canadenses foram pioneiros na construção dessa história, liderados por homens habilidosos com grande espirito de liderança.
Infelizmente, todo o pioneirismo da Colored Hockey League foi ignorado ou até mesmo apropriado pelos atletas brancos. Exemplo são equipes exclusivas de brancos que utilizaram inovações e as regras desenvolvidas pela Colored Hockey League e não lhe creditando da maneira correta. Sendo assim, muitos registros dessa contribuição negra para o esporte se perdeu ao longo dos anos.
Era James Kinney/James Johnston
Após Williams ter ido para Londres, quem começou a tomar conta da organização da Liga foi James Kinney, um jovem membro da igreja batista. Ele acreditava que os negros naquela época alcançariam status social através de autodisciplina, profissionalismo e trabalho em equipe. Junto com James Robinson Johnston, advogado negro nativo de Nova Scotia com conexões fortes com firmas de direito, a liga começava a ficar forte.
Ambos cuidavam da imprensa e do funcionamento da equipe, e através da igreja, eles buscavam os jogadores para os times. O Halifax Eureka virou, naquele momento, o carro-chefe da Colored League. Com esse avanço e prestígio, os jogadores negros poderiam competir em conjunto com a Senior League.
A Senior League, composta pelos times Dartmouth Chebutors, Halifas Crescents e o Halifax Wanderers, era só de jogadores brancos. Por este motivo, os jogadores negros poderiam jogar, conquanto que eles fossem os últimos a utilizar o rinque de gelo artificial.
Os jogos
Os jogadores arcavam com todos os custos dos equipamentos de hockey. Sendo assim, poucos usavam equipamentos de proteção, como capacetes, máscaras e luvas. Não existia substituição de jogadores, ou seja, se algum jogador se machucasse, deveriam esperar até que ele voltasse; se ele não retornasse, o outro time deveria também tirar um jogador do rinque. Foi apenas em 1902 que as substituições começaram a acontecer. O tipo de stick mais comum era dos Mi’kmaqs, feito pelos nativos da região. Como os jogadores não usavam uniformes, era difícil a distinção de jogadores e de equipes.
Henry Franklyn “Little Braces”, goleiro da equipe negra do Dartmouth Jubilees, tinha um estilo de jogar revolucionário. Ele foi o primeiro goleiro a se abaixar no gelo para defender o seu gol. Atitude esta que era oposta às regras, uma vez que estas determinavam que os goleiros deveriam ficar em pé. E, embora 20 anos depois, a novidade Franklyn tenha sido aceita pelo hockey, o feito foi creditado para os irmãos Lynn e Frank Patrick, atletas brancos que competiam na liga do Pacifico Oeste.
Por fim, o primeiro jogo entre uma equipe composta somente por negras e uma outra por somente brancos foi realizada em 1900. O West End Rangers jogou contra o Abegweits, da Senior League. O Rangers perdeu por um placar de 5-4.
O término da Hockey Colored League
Com a liga crescendo, as coisas pareciam andar na direção certa. James Kinney rapidamente era uma das principais vozes do Orgulho Negro na sociedade de Nova Scotia.
Entretanto, um conflito entre a prefeitura de Halifax e a comunidade de Africville, predominantemente negra, teve efeitos desastrosos para a Liga. A prefeitura acordou com poderosos donos de ferrovias a expropriação de terras de Africville. Descontentes, os residentes do local propuseram um acordo de compensação. Por fim, Johnston escolheu defender Africville.
Essa disposição de Johnston causou um efeito cascata, e a retaliação da prefeitura atingiu a Liga. As equipes passaram a ser vistas como inimigas e tudo era feito no sentido de prejudicá-las. Exemplo disso era o tempo no gelo. As equipes começaram a ser privadas de praticar e quando liberavam o rinque, o gelo estava tão gasto que era impossível jogar. Não havia mais convites formais entre os times, sem nenhum tipo de imprensa para anunciar. Assim, a Liga morria lentamente, justamente como os brancos queriam.
Após o término
Todavia, apesar de terem acabado com a Colored Hockey League, jogadores de hockey negros voltariam a jogar hockey, dessa vez sem o envolvimento de Kinney.
Em 1920, alguns times voltaram e se enfrentaram, agora com as regras de hockey mudadas. O jogo era com 6 homens de cada lado, durante 3 períodos de 20 minutos.
O Halifax All-Stars jogou contra o Africville Sea-Sides, time composto por muitos veteranos: o mais novo jogador tinha 24 e o mais velho 43 anos. Apesar de começarem vencendo por 3-0, perderam o jogo por 7-4. Duas semanas depois, o Sea-Sides dominaram, e ganharam por 8-2.
A performance do Sea-Sides demonstrou a qualidades dos jogadores originais da Liga. Mais de 20 anos tinham passado e, mesmo assim, eles conseguiram ganhar de um time bem mais novo.
Há registros de jogos também em 1929. Em Boston, alguns ex-jogadores das Marítima formaram uma equipe denominada “The Colored Panthers“, que chegou a disputar algumas partidas. A intolerância, o racismo, a crise econômica, entre outros fatores, levaram à descontinuidade definitiva da Liga.
A existência esquecida
A história da Colored Hockey League está intrinsecamente ligada à história do racismo no Canadá. Por muito tempo, acreditava-se que o racismo no Canadá era de forma branda ou que basicamente não existia. Entretanto, a história da Liga, que teve que combater diversos problemas para existir, mostra o contrário. O fato da Liga ter sido destruída justamente por problemas raciais demonstra isso.
Apesar de o Canadá ser um um país multicultural, construído por franceses, ingleses, nativos americanos e negros, a falta de consideração e de reconhecimentos dos primeiros jogadores negros pioneiros de hockey pela NHL e na história do hockey é uma contradição e desvalorização de tais povos.
“Hoje, não há monumentos para a Colored Hockey League of the Maritimes e alguns poucos livros de hockey reconhecem a Liga. (…) Não há menção no Hockey Hall of Fame do impacto dos negros no desenvolvimento do hockey moderno. Não há referencias das origens negras do Slap Shot ou o estilo inovador do goleiro Franklyn. (…) É como se se a liga nunca tivesse existido. O hockey, hoje, é um esporte mais branco que o inverno Canadense. (…) Entretanto, mesmo assim, sempre existirá um período que chamaremos de Black Ice.” (George e Darril Fosty, no livro Black Ice: The Lost History of the Colored Hockey League of the Maritimes)
Foto: Black Ice: The Lost History of the Colored Hockey League of the Maritimes, 1895-1925
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